Nunca entramos duas vezes no mesmo rio
Você está vendo um álbum da família e encontra uma foto sua quando era jovem. Você estava com um cabelo esquisito, uma roupa nada a ver, ou simplesmente fazendo algo estúpido demais, mas que, naquela idade, você achava que era o máximo. Você percebe então o quanto você mudou. “O que eu tinha na cabeça?”, você pensa baixinho, envergonhado, esperando que o data center que hospeda aquele arquivo seja engolido por uma falha tectônica.
Não, não encontrei nenhum álbum antigo e, se o tivesse encontrado, de nada me afetaria, já que sigo com cabelo esquisito, roupas nada a ver e fazendo coisas estúpidas. Porém, encontrei algo tão ou mais revelador do que um álbum de fotos: um disco rígido com tudo que publiquei (e também deixei de publicar) na Internet desde 21 anos atrás.
Nada é permanente, exceto a mudança
Ao redescobrir esses meus textos antigos, me bateu uma vontade súbita de ressuscitar ou ressignificar alguns deles e hospedá-los aqui, neste site. “Afinal, tive tanto trabalho, escrevi tanto por tanto tempo… Talvez ainda haja algo ali que valha a pena ser público”, pensei.
Ao reler aquilo tudo, foi então que entendi que algumas coisas só servem para um certo tempo, contexto e propósito. Fiquei chocado com o quanto mudei ao longo de duas décadas. É claro que meu estilo de escrita era voltado a um público bastante específico (jovens nerds que gostavam de se informar sobre ciência de intencionalmente descontraída). Mesmo com isso em mente, boa parte daquele conteúdo passou a me soar infantil, exagerado ou simplesmente “cringe”.
Mais do que perceber que nosso senso de humor é fluido — e pode não envelhecer bem —, o que mais me surpreendeu foi a convicção e a soberba com que eu me expressava às vezes. Meus valores sempre foram os mesmos, mas algumas das opiniões que defendia hoje são diametralmente opostas. Quando os mais velhos dizem que os mais novos ainda têm muito o que viver, será que é isso que estão falando?
“Quando eu tinha 14 anos, meu pai era tão ignorante que eu mal suportava tê-lo por perto. Mas quando cheguei aos 21, fiquei surpreso com o quanto o velho havia aprendido em sete anos.”
– Mark Twain
Enfim, nem tudo naquele disco rígido poderia ser reaproveitado. Nem tudo que vivenciamos deve continuar existindo no presente. “Ninguém pode entrar duas vezes no mesmo rio, pois, quando nele se entra novamente, não se encontra as mesmas águas, e o próprio ser já se modificou”, disse o filósofo Heráclito de Éfeso há 2.500 anos. O mundo mudou. Eu mudei. O passado serviu ao seu propósito; agora, é uma questão de olhar para frente. Ainda assim, mantive alguns daqueles textos aqui para fins históricos. Por exemplo, acho legal olhar para trás e ver o que eu achava da computação quântica há 18 anos.
Essa experiência, de ver a si mesmo através do túnel do tempo, serve como um lembrete: observar minhas mudanças só foi possível porque eu escrevia rotineiramente. Portanto, crie a porra de um blog se você ainda não o fez.